quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Através dos Espinhos.

Imagem localizada no google e editada por mim. Problemas com crédito ou uso, favor entrar em contato.


            Sorriu, sentindo a primeira gota de chuva atingir seu rosto e refrescar a pele, lavando a mistura suor, sujeira, lágrimas e sangue que a cobria. Todo seu corpo parecia meio dormente, com arranhões que pulsavam quentes cobrindo seus membros.

         As roupas não passavam de trapos, sujos e rasgados, machados de terra e sangue, e a tira de uma de suas sandálias havia arrebentado, tornando incomodo andar.

         Tocou em seus cabelos com cuidado, sentindo os espinhos, presos no emaranhado de nós, espetarem seus dedos, tomando consciência de que seria extremamente trabalhoso e dolorido desembaraçá-lo.

         Apesar de tudo isso, sorria, sentindo-se bem consigo mesma. Vencera.

         Olhou para trás, vendo o grande emaranhado de arvores quase negras e arbustos baixos, que formavam o mar de espinhos que acabava de atravessar e sentiu vontade de gargalhar, sentindo-se viva como nunca antes.

         Todo o seu corpo doía, mas a sensação era boa. O sabor da vitória era doce e cobria o gosto férreo em sua língua.

         Durante tanto tempo relutou em enfrentar os espinhos. Gastou anos buscando caminhos alternativos e métodos de chegar ao outro lado sem ter que se enfiar naquele mar de dor.

         Porém era inútil, não importava por onde fosse ou o quanto desviasse, sempre acabava deparando-se com eles novamente. Extremamente afiados e parecendo fileiras de dentes em sorrisos terríveis, que debochavam de seu medo.

         Olhando-os agora, continuavam tão perigosos quanto antes, porém pareciam respeitá-la, como se reconhecessem sua bravura em  enfrentá-los.

         Talvez fosse apenas reflexo de suas próprias emoções. Se antes temia a dor e se julgava fraca, agora via nos arranhões provas da sua força e exibiria as cicatrizes com orgulho.

         Não que fosse algo bonito, mas eram provas de que superara aquele obstáculo e nada poderia ser mais gratificante.

         Não houve rotas alternativas, nem nenhum método efetivo para que fugisse do espinheiro. Todas as tentativas servindo para lhe ensinar de que precisaria encará-lo.

      Lembrava-se de quando finalmente desistira de fugir e dera o primeiro passo entre os galhos retorcidos.

Ainda podia ver a entrada, quando as primeiras lágrimas escorreram, com os espinhos arranhando sua pele, doendo ainda mais sempre que buscava se desviar.

Não demorou para que entendesse que não havia hipótese de se machucar menos, evitar a dor apenas a tornaria pior.

Então respirou fundo e começou a avançar a despeito da dor, incapaz de negá-la, mas prosseguindo de qualquer forma.

Logo seu corpo parecia anestesiado e o que era insuportável, agora não passava de um incomodo.

Nunca acreditou que era capaz, mas agora percebia que duvidara da própria força, sem nem ter tentado. Paralisada pelo medo de se machucar, atrasara seu avanço em muito tempo, quando na verdade sempre teve dentro de si o necessário para superar aquele muro de espinhos.

A chuva caia forte, refrescando seu corpo quente, lavando os machucados e fazendo-os arder de modo que lhe fazia sentir ainda mais viva.

Os raios cortavam o céu e era como se aquela energia percorresse seus membros, as batidas de seu coração tão altas, quanto os trovões que faziam o solo vibrar aos seus pés.

Olhando para frente, via o longo caminho que ainda a aguardava, antes de atingir seu destino. Longo e sinuoso, passando por locais desconhecidos, com muitas ameaças e novos desafios.

Pensou em quem era antes do espinheiro e percebeu que deveria sentir-se revoltada, afinal depois de toda a dor e sofrimento, ainda muito mais a esperava. Porém não se sentia assim.

Acabava de aprender um pouco mais sobre sua própria força e percebia que nada poderia impedi-la de atingir seu objetivo.

Jogassem os maiores desafios a sua frente, enfrentaria a todos, pois superara o espinheiro e descobrira sua verdadeira capacidade e resistência.

Sorriu, dando um novo passo, deixava para trás não um espinheiro terrível, mas todo o medo e insegurança que a impediam de avançar até então.

Bastava continuar em frente, crescendo e tornando-se ainda mais forte. Pois agora que sabia ser capaz, nada poderia pará-la.
Fim.

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