Seu corpo era a terra, seus cabelos como os
cipós, os olhos eram pedras preciosas. A vida em seu interior era o fogo,
alimentado pelo sopro do ar e a água fluía em seu interior e exterior, renovando-se
de maneira continua. Vivia em meio à natureza e a natureza nela vivia.
Era
capaz de ouvir a voz dos elementos, entendia a linguagem das plantas e dos
animais. Sentia-se renascer com o raiar do sol e ser abraçada pela luz da lua a
cada anoitecer.
Tinha
tudo, pois não tinha nada. Ela e os seus apenas pegavam o que precisavam, sem
exageros, sem posses. Sem dor ou desnecessárias mortes. Compreendia os ciclos
da natureza, se harmonizava cem eles e preservava o equilíbrio
Quando
pela primeira vez, disseram “é meu!” Tomando para si o que não precisava,
tirando do outro, iniciou-se a separação desse povo e a natureza.
Lentamente,
deixaram de ouvir as vozes da natureza. Os animais se tornaram perigosos, as
plantas viraram descartáveis os elementos, coisas a serem exploradas. O povo
começou a se dividir.
Já
não mais se buscava ter o suficiente, porém se cobiçava ter cada vez mais e a
qualquer preço. Os valores mudaram. Não mais se pensava no bem do grupo, mas
apenas no próprio. Cada um por si, se tornaram cada vez mais solitários,
tentando substituir com posses a ausência dos companheiros.
Então
veio o terrível medo, o desconhecimento do outro como um semelhante, a
insegurança e as guerras, o desejo de subjugar e a incapacidade de aceitar o
diferente.
A donzela vendo a
decadência de seus irmãos e sentindo no próprio corpo as chagas que eram
abertas em toda natureza, chorou e gritou. Pediu que parassem com aquilo, que
enxergassem o abismo para que seguiam.
Porém ninguém
pareceu ouvi-la, caindo cada vez mais, batendo nas rochas, buscando pisarem uns
nos outros para retardar a própria queda, sem perceberem que juntos poderiam
voar.
Ela
continuou chorando e gritando até o fim, até suas forças se esgotarem.
Ainda
hoje seu povo ouve os gritos dela, ecoando nas próprias almas, saudosas dos
áureos tempos.
Aqueles que se
atentam a esses gritos, passam a atentar para as vozes da natureza. Voltam a
entender a linguagem das plantas e dos animais, voltam a sentir os elementos
dentro de si e ao seu redor.
Então,
lembrando-se que são partes de todo e que tudo que há esta dentro deles, eles
começam a gritar junto da donzela e, assim, fazem com que mais membros desse
povo passem a ouvir a voz do mundo de que fazem parte.
Eles
continuarão gritando, porque sabem que a cada novo grito, renova-se a esperança
de melhora. A mesma esperança que nunca morreu no coração da Donzela.
Fim.
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